Depois da quebra de Adão, cada parte do desejo de receber começa a se sentir independente, separada de seu ambiente e desejando absorver dele. Esse desejo de absorver, essa força de atração ou gravidade — o paralelo físico do desejo de receber — formou os primeiros aglomerados do universo, que depois se tornaram a substância das primeiras galáxias do universo.
Com espaço e campo de gravidade surgiram formas mais estruturadas do desejo de absorver (ou seja, do desejo de receber), e as partículas apareceram. O processo de absorção continuou, e as estrelas nasceram com planetas ao seu redor. Dessa forma, a gravidade, a força mais fraca da Natureza, criou a infraestrutura do universo inteiro,
assim como o Estágio Um das quatro fases do desejo primordial da criação, o mais fraco desejo de receber, criou a infraestrutura para os Quatro Estágios e todos os mundos espirituais que se seguiram.
Como no Estágio Um, o desejo de receber no corporal inanimado consiste basicamente no desejo de assegurar sua própria sobrevivência, sustentar a si mesmo. Sua única relação com os outros é que ele resiste a qualquer tentativa de quebra, dissolução ou mudança. Ainda, como resultado do nível inanimado e sua aspiração por manter sua própria sobrevivência, algumas partículas “descobriram” que elas poderiam assegurar melhor seu futuro, colaborando com outros elementos.
Ao Contrário de Darwin, A Cabala Afirma 'Não Há Coincidência'
Contrariamente à teoria da evolução de Darwin, a Cabalá afirma que não há coincidência. Na realidade, as partículas não “descobrem” ou por acaso colaboram e subsequentemente se beneficiam ao fazê-lo. Isso implicaria que a Natureza não tem propósito, é randômica, e que não há meta pré-determinada no final do processo. Em vez disso, Baal HaSulam explica (em “Prefácio à Sabedoria da Cabalá”, Estudo das Dez Sefirot e outros lugares) que, sendo o nosso mundo o último em uma série de eventos de causa-e-efeito, o desejo que aparece em nosso mundo já contém (embora não conscientemente) reminiscências dos estados anteriores, uma vez que eles são suas ramificações. Por isso, o desejo de receber neste mundo já contém reminiscências dos Quatro Estágios, o Partzuf, e todos os mundos espirituais. Como resultado, a preparação, a configuração para a descoberta dos benefícios da colaboração existe previamente em todos os níveis de desejo neste mundo. É isso que lhes permite “miraculosamente” descobrir os benefícios da “negociação em harmonia”, como coloca Sahtouris.
Muitos físicos concordam que as partículas não necessitam de muito tempo para “descobrir” os benefícios da colaboração. Uma publicação do Observatório de Haystack, um centro de pesquisas do MIT, explica: “Quando o universo tinha 3 minutos de idade, ele já havia resfriado o suficiente para que prótons e nêutrons se combinassem em núcleos.” Para se desenvolver ainda mais, no entanto, tiveram de forjar colaborações adicionais, que se manifestaram na forma de elétrons, e equilibraram a carga positiva do núcleo. Assim foi como os primeiros átomos apareceram.
Para essas partículas, ser parte de um átomo ─ diminuindo, portanto, seu interesse próprio em favor do interesse do átomo ─ era toda a correção de que necessitavam. Agindo para o bem do sistema e não para seu próprio bem, deixaram de estar centradas em si mesmas e começaram a se centrar no sistema. Elas se tornaram “conscientes” do seu ambiente e de como poderiam contribuir com ele. Assim, elas se tornaram “altruístas”, embora pela razão egoísta de perpetuar sua própria existência.
A “recompensa” das partículas que primam em doar para o seu ambiente é a criação de um ambiente forte, resultando em átomos estáveis. E isso garante a sua existência futura.
Além disso, como os átomos precisam de todas as suas partículas para se manter, internamente eles protegem suas partículas. Dessa forma, abdicando do interesse próprio em prol do interesse de seus átomos, as partículas angariam o interesse de todo o sistema no bem estar desses átomos. Esse “acordo” provou ser tão bem sucedido, que, “Momentos depois do Big Bang, prótons e nêutrons começaram a se combinar para formar o hélio- e outros elementos básicos”, disse Robert Rood, da Universidade da Virgínia, conforme citado em um comunicado da Rádio Nacional do Observatório de Astronomia. Assim os primeiros minerais surgiram.
Por Que Células no Corpo Humano São um Exemplo para as Pessoas na Humanidade
O corpo humano é possivelmente o exemplo mais vívido do modus operandi de abdicar do interesse próprio em benefício do interesse do sistema hospedeiro, recebendo em troca a proteção desse sistema. No corpo humano, assim como em qualquer organismo, cada célula tem uma função específica. Para o organismo sobreviver, cada célula deve desempenhar sua função com o melhor de suas habilidades e substituir a meta de manter sua própria vida pela meta de manter a vida do seu organismo hospedeiro. Se uma célula começar a agir contrariamente a esse princípio, seus interesses logo irão conflitar com os do corpo, e os mecanismos de defesa do corpo irão destruí-la. Assim, é provável que se origine um tumor de células insubordinadas, que lutam para consumir os recursos do corpo em seu próprio benefício. Quando esse tipo de processo ocorre, nós o diagnosticamos como “câncer”.
Se o câncer vencer, o corpo morre e o tumor morre junto com ele. Se o corpo vence e o câncer morre, o corpo sobrevive com as células do corpo que não se tornaram malignas, e as células egoístas são extintas. Esse é o mecanismo de segurança contra falhas com o qual a Natureza assegura que sistemas egocêntricos não existam. Aqui, também, não há nada de milagroso, simplesmente os mecanismos egoístas invariavelmente se consomem até a extinção, porque consomem sua fonte de alimento.
Por conseguinte, é interesse de todas as células do corpo curar o tumor. Colocado de outra forma, garantindo a sobrevivência dos elementos do sistema, os elementos naquele sistema promovem o bem estar do sistema antes de prover seu próprio bem estar. Em troca, o sistema irá prover o bem estar deles e garantir sua sobrevivência.
O princípio que acabamos de explicar não é válido apenas para partículas, átomos e organismos, mas para toda a vida. Aplicando-o, todos os elementos da Natureza aprendem a trocar sua natureza egoísta por uma natureza altruísta, que considera o bem coletivo antes de seu próprio bem.
Assim, voltando ao nosso tópico de observar o universo primordial, uma vez que as partículas juntaram-se para criar átomos, átomos começaram a se unir, criando, dessa forma, as primeiras moléculas. Estas aderiram à mesma regra, e as que sobreviveram foram aquelas cujos átomos estavam fortemente conectados, assim como com os átomos, abdicando de seu próprio interesse frente ao interesse de seu sistema hospedeiro ─ as moléculas.
Em todo esse processo, não há livre arbítrio. Nem átomo nem molécula podem optar por não serem criados, porque os elementos que os constituem procuram o melhor modo de formá-los para melhor proteger seus interesses. Ainda, criando moléculas, os átomos realizam algo muito mais significativo do que proteger a si mesmo e às partículas que os criaram. Assim como as partículas, eles construíram um sistema antes de atender a seu interesse próprio e, ao fazê-lo, os átomos se transformam de entidades auto-orientadas em orientadas para o sistema, o que significa altruísmo.
Desse modo, outra camada do nível inanimado do desejo de receber foi corrigida. E embora não hajo livre arbítrio nessa correção, o modus operandi altruístico é todo o requerido para os minerais serem considerados corrigidos. Como o Estágio Um não tem qualquer livre arbítrio na sua evolução, também o nível inanimado não tem livre arbítrio na sua evolução; ele simplesmente trabalha para assegurar sua sobrevivência da melhor forma possível.
Curiosamente, a teoria de Darwin reflete quase o mesmo padrão em seu princípio de seleção natural. Uma diferença entre a Cabalá e o Darwinismo é que o Darwinismo define moléculas estáveis vs. não estáveis, e a Cabalá define moléculas equilibradas vs. desequilibradas. Moléculas equilibradas apoiam os átomos que as compõem, e os átomos igualmente apoiam suas moléculas.
Em O Gene Egoísta, Richard Dawkins — um dos mais renomados defensores contemporâneos de Darwin — descreve o processo de evolução molecular: “A mais antiga forma de seleção natural foi simplesmente a seleção de formas estáveis e a rejeição das instáveis. Não há mistério nisso. Isso tinha de acontecer por definição.”
As observações de Dawkins são congruentes com as da Cabalá. Na terminologia Cabalística, uma molécula estável é aquela que abdica de seu próprio interesse em favor do interesse da molécula. As “formas estáveis” de Dawkins, portanto, são sinônimos das “moléculas corrigidas” da Cabalá, nas quais os átomos se tornaram “altruístas”. Reciprocamente, nas moléculas instáveis (não corrigidas), um ou mais átomos se mantêm focados em seus interesses próprios.
Seguindo o mesmo procedimento das partículas e dos átomos, as moléculas começaram a se unir e a criar o que os biólogos chamam “interações moleculares” ou “conexões”. O mesmo aconteceu com as moléculas, interações em que as moléculas se dedicaram à força e ao bem estar das conexões prosperaram, e aquelas cujas moléculas apoiaram apenas parcialmente a conexão se desintegraram.
Existem muitas formas de interações moleculares na natureza, mas há menos de quatro bilhões de anos, uma interação em particular marcou a mudança entre o estágio inanimado na Terra (e talvez no universo) e o vegetativo. Esse agregado especial de moléculas recebeu o nome de “Ácido Desoxirribonucleico”, também conhecido como DNA.
Nos átomos, as partículas assumem diferentes funções: alguns formam o núcleo e outras formam a parte externa ou casca, por exemplo. Similarmente, nas moléculas, os átomos assumem diferentes funções e devem aderir a formas rígidas de conexão. E finalmente, na interação molecular, cada molécula exerce uma diferente função.
Com o aparecimento do DNA, porém, as coisas começaram a mudar. O DNA não é mais uma estrutura feita de diferentes moléculas que formam uma estrutura. Ele é uma estrutura que pode interagir com outras estruturas, e a cada estrutura é atribuída uma função diferente. Essas, combinadas, servem ao bem da estrutura. Em biologia, essas estruturas são chamadas “células” ou “organismos unicelulares” e constituem a mais primitiva forma de vida.
Pode-se argumentar que, essencialmente, esses organismos funcionam quase que da mesma maneira que os átomos, as moléculas ou as estruturas moleculares introduzidas antes. A estrutura única criada em torno do DNA, no entanto, permite que ocorram duas funções até então inexistentes:
- O DNA é a primeira estrutura conhecida na natureza que pode replicar a si mesma, bem como replicar as estruturas moleculares que o suportam.
- Células são as primeiras estruturas que sistematicamente interagem com seu ambiente. Elas absorvem nutrientes de seu ambiente, processam-nos para extrair a energia de que necessitam para sua sobrevivência e então excretam os resíduos. Além disso, as células podem repetir com precisão esse processo tantas vezes que podem de fato transformar seu ambiente.
Há muitas definições do que é a vida. Para ficar de um lado seguro, escolho a definição apresentada pela Enciclopédia Britânica: “Matéria que apresenta certos atributos, que incluem responsividade, crescimento, metabolismo, transformação de energia e reprodução.”xix As primeiras células, chamadas “procariontes”, possuíam todos esses atributos e representaram uma evolução direta da interação molecular. Assim, o começo da vida como conhecemos deveu-se à mesma lei pela qual todos os sistemas atingem equilíbrio e sustentabilidade — os constituintes abdicam de seus interesses próprios em beneficio do interesse de seu sistema hospedeiro, para, em contrapartida, o sistema cuidar deles.
"Como Entender a Vida Inanimada de um Modo que O Prepare para a Próxima Fase da Evolução" é baseado no livro, Interesse-Próprio Vs. Altruísmo por Dr. Michael Laitman